Ana Sofia Fernandes – Presidente da Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres

Opinião
18 Novembro 2019

Em2020 a comunidade global vai assinalar o vigésimo quinto aniversário da Quarta Conferência Mundial sobre as Mulheres e da adoção da Declaração e Plataforma de Ação de Pequim (PAP) (1995), o roteiro mais ambicioso para o empoderamento das mulheres e raparigas em todo o mundo, com objetivos estratégicos e ações para alcançar a igualdade em 12 áreas críticas. Será, também, o quinto ano no caminho para realizar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, nos quais a igualdade entre mulheres e homens é central, havendo um horizonte temporal para a realizar: 2030.

O processo mundial já começou. A Reunião de Revisão Regional Pequim + 25,realizada de 29 a 30 de outubro de 2019 em Genebra na ONU, proporcionou um fórum para os Estados Membros reverem o progresso e identificarem desafios na implementação da PAP nos últimos cinco anos. A Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres, enquanto organização com estatuto consultivo especial no Conselho Económico e Social da ONU, participou nos trabalhos, tendo eu sido oradora em representação do Lobby Europeu das Mulheres no painel sobre “Mulheres na Liderança: representação das mulheres na política e na tomada de decisões”.

Foi evidente que no período em análise os países priorizaram três áreas: o combate à violência, o que reflete o impulso gerado pela Convenção do Conselho da Europa para a prevenção e o combate à violência contra as Mulheres e a violência doméstica (Convenção de Istambul); a independência económica das mulheres, uma prioridade antiga que se reforçou num contexto de austeridade, com os esforços a concentrarem-se na reconciliação entre a vida profissional, familiar e pessoal, no combate à desigualdade salarial e nas políticas ativas de emprego; e a participação política, verificando-se que alguns países estão perto da paridade ao nível nacional e inúmeros outros estão a implementar medidas de ação de positiva, como quotas.

No âmbito da reunião foram identificadas questões emergentes e prioridades futuras. Desde logo, a importância de garantir a participação das mulheres e raparigas nas áreas STEM – Science, Technology, Engineering and Mathematics para que venham a beneficiar da crescente procura de emprego com elevada base tecnológica, o que implica combater os estereótipos de género que perpetuam a segregação horizontal, tanto na educação como no emprego. A participação limitada das mulheres neste domínio foi identificada como uma barreira à sua plena participação nas áreas da proteção ambiental, alterações climáticas egestão de riscos de desastres, assim como a sua fraca representação em conselhos e em cargos de administração no setor privado, como o da energia. A ausência de uma perspetiva de género na proteção ambiental, mudanças climáticas e gestão de riscos de desastres foi, na verdade, a lacuna mais evidente nos relatórios nacionais.

Uma tendência significativa e crescente são as diversas iniciativas dos Estados para abordar o trabalho do cuidado não pago e o trabalho doméstico. Incentivos à partilha através de licenças parentais, incentivos fiscais, entre outros, visam fomentar uma maior participação das mulheres no mercado de trabalho ao mesmo tempo que incentivam uma maior participação dos homens e dos rapazes nas atividades do cuidado.

O desafio emergente da violência online exige uma resposta abrangente, envolvendo intervenções nos setores da educação, justiça criminal e TIC. As respostas coletivas ao assédio sexual ressurgiram como uma prioridade política à luz do movimento #MeToo, e a violência contra as mulheres idosas e a violência obstétrica ainda não são devidamente abordadas.

O processo de revisão continuará em março de 2020 na 64ª Sessão da Comissão sobre o Estatuto das Mulheres, em Nova Iorque, na ONU. Em maio, numa organização da ONU Mulheres e co-presidido pela França e pelo México, terá lugar o Fórum Geração Igualdade orientado para a ação com parcerias entre países, sociedade civil, empresas e outros atores.

Ana Sofia Fernandes
Presidente da Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres